As duas faces do mesmo 'eu'

“Por que é que não consigo me controlar? Por que diante de situações que eu saberia lidar racionalmente, surgem independente da minha vontade o medo, a raiva, a ansiedade, o nervosismo e a preocupação? Parece que não tenho a opção de evitá-los ou eles têm mais força do que eu!”

doublemeDo modo como isso é dito, parece que há dois ‘eus’: um que reage negativamente diante das situações com pensamentos e emoções inapropriadas e outro que observa e é afetado pelas consequências. É como um indivíduo com duas cabeças: uma encrenqueira e outra inteligente. Toda vez que a cabeça encrenqueira apronta, a cabeça sã é afetada. No fundo, elas são uma só.

É preciso compreender que não existem dois ‘eus’. Não existem pensamentos e emoções separados da mente, não existe mente separada do ‘eu’, não existe ‘eu’ separado daquele que observa. Esse aspecto problemático de nós mesmos que nos sabota com a força de seus pensamentos e emoções negativas é o que chamamos de ego. É uma entidade que criamos dentro da realidade que a mente opera, a dualidade. É nutrido pelo nosso hábito.

Esse ego é formado pela energia que investimos em nossos desejos, em pensamentos e emoções, resultando em uma identidade com a qual nos identificamos cada vez mais. Torna-se uma entidade fictícia que criamos e que tem suas necessidades, tem instinto de sobrevivência e precisa ser nutrida. Ela surge no mundo da dualidade, portanto é marcada pela parcialidade e julgamento. Tem características positivas e negativas. A energia investida em um desejo também é investida em uma aversão. Tudo no mundo da dualidade tem um lado positivo e outro negativo. É natural! Quando você investe a sua energia em algo, ela será usada para sustentar uma existência imperfeita. Se você der esmola a um mendigo que seja viciado, certamente ele comprará comida para se alimentar, mas também comprará drogas. É natural – ambas são necessidades dele. Você não está dando dinheiro a um anjo.

Portanto, quando você acumula crenças, opiniões, concepções, você está alimentando um aspecto dualista e imperfeito que, embora possa gerar satisfações temporárias, também lhe causará problemas. Certamente te sabotará, afinal, você está nutrindo uma realidade fictícia que não encontrará amparo na realidade. Cedo ou tarde, será frustrada pelo fato da vida. Quanto mais ela é alimentada, quanto mais você investe o seu tempo e energia nela, mais identificado você se torna, mais forte fica a identidade dessa entidade e mais ela vai lutar para sobreviver, gerando emoções reativas que não são nada confortáveis. Se algo imperfeito se torna forte demais, pode ter certeza que causará enormes problemas.

De acordo com a energia investida, eles podem ter muita força, mas nunca superarão a força da sua presença. Eles desmoronam diante do silêncio e da realidade do agora, pois são apenas criações.

Seja não-eu, aja com a não-mente, habite o vazio.

Marco Moura

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