Chán
Grandes mestres do passado atingiram uma compreensão profunda da vida. Não porque tiveram um árduo treinamento intelectual, mas porque abandonaram todas as falsas concepções sobre a realidade e transcenderam os limites da mente comum. Da experiência da vida em sua originalidade e espontaneidade surgiu o Chán.
Desde o nosso nascimento, aprendemos a interpretar os acontecimentos, a identificar os seres e objetos através de noções comparativas. Supomos o claro quando verificamos o escuro, descobrimos o "eu" quando admitimos o "outro". A partir da definição de referenciais, desenvolvemos nosso conhecimento do mundo, baseados em nossas próprias conclusões mentais. Por serem pessoais e subjetivas, essas noções não podem ser consideradas verdades absolutas. Não podemos dizer onde termina o claro e começa o escuro, pois os opostos fazem parte do mesmo princípio. A concepção de um ou de outro é uma questão de interpretação.
Esse princípio é observado em todos os fenômenos no universo, onde nada possui uma realidade absoluta e imutável. Tudo é relativo e depende do olhar do observador. Essa falta de substancialidade real, ou seja, a vacuidade dos fenômenos, é conhecida nas tradições budistas como sunyata. Mais um reconhecimento das características transitórias do universo do que propriamente a nulidade de sua existência, o conceito do sunyata abre a nossa mente para um campo além do entendimento comum e intelectual. Ele nos atenta para o fato de o que chamamos de real ser uma idéia suposta e dependente de um referencial. Aquilo que existe, ao mesmo tempo não existe e esse entendimento não pode ser alcançado se não superarmos a lógica materialista.
Os meios para se experimentar essa consciência dependem principalmente da prática da meditação. Procura-se atingir um estado elevado de consciência, a não-mente, onde percebe-se a natureza subjetiva da mente comum. Nesse estado, não há identidade, pois a mente se une à grande mente (bodhicitta) e as distinções deixam de existir. É o estado do samadhi.
Marco Moura
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